Entre o pioneiro Mundial de 1930 e aquele, que, dentro de dois anos, teremos no Brasil, já não existe qualquer ponto de contato. Ao longo de 82 anos, o futebol, como tudo na vida, foi mudando muito. Desde o tempo dos calções pelos joelhos de Andrade, ás chuteiras aerodinâmicas de Cristiano Ronaldo, existe um abismo, tático, técnico e de ritmo de jogo, a separar esses dois tempos. No fundo, tudo se resume a uma questão de ritmo de jogo.
Quando venceu o primeiro Mundial da história, o Uruguai jogava num primitivo 3-2-5. Era o tempo dos dribladores, não se admitiam passes para trás e o futebol desconhecia a palavra tática na sua essência. Com o tempo, os sistemas foram evoluindo, passou-se pelo método, WM, 4-2-4, diagonal, 4-5-1, cattenacio, 4-3-3, 4-4-2, 5-3-2, até o atual 4-2-3-1, o esquema mais utilizado no futebol moderno. Independente do esquema sempre houve jogadores de qualidade. Entre eles, no entanto, um fato falou mais alto do que a qualidade técnica, fazendo a diferença de época: a condição atlética e o ritmo de jogo.
Revendo, por exemplo, os jogos do Brasil no Mundial de 58, é fácil descobrir Didi caminhando lentamente, a passo, no meio-campo, executando depois, sem grande oposição um longo passe em profundidade. Um gesto ainda possível de rever em Gerson, canhotinha de ouro, no titulo de 70, mas já menos solto de marcação.
Com o passar dos anos, a pressão sobre a bola foi reduzindo cada vez mais o tempo e o espaço para os artistas segurarem a bola. Recentemente, um estudo sobre o tema, demonstrava, estatisticamente, o tempo que um jogador tinha para segurar a bola antes e um adversário lhe cair em cima para desarmá-lo: 1958: Garrincha 4 segundos; 1962: Garrincha: 3,5; 1966: Eusébio: 3; 1970: Rivera: 3; 1974: Cruyff: 2,5; 1982: Zico: 2; 1986: Maradona: 1,5; 1994 e 1998: Baggio e Zidane: 1.
Não há duvida que o tempo para pensar diminuiu. Di Stefano ou Garrincha continuariam hoje, pela sua magia técnica, a ser grandes estrelas, mas, fisicamente, teriam de ser jogadores diferentes, pois os defensores, e seu sistema de pressing, estão hoje muito mais ativos.
No fundo é uma questão de velocidade e ritmo. Basicamente, o futebol evoluiu, sobretudo na abordagem coletiva do jogo. Antes, essas grandes individualidades quase viviam num mundo á parte, hoje, os seus legítimos sucessores, como Ganso ou Totti - no seu ápice -, terão, para sobreviver, de se integrar nas manobras de todo o onze e incorporarem, em campo, a tal dinâmica da tática.
Observando a história, detecta-se um ponto fulcral onde tudo mudou: 1974. A revolução teve a assinatura de Cruyff, o primeiro dos grandes futebolistas modernos. Uma análise que conclui ser hoje muito mais difícil, por falta de tempo e espaço, o emergir de gênios com a mesma aura de antigamente.