Sou um fã da parte técnica e tática do futebol. Gosto de analisar esquemas táticos, inventar posicionamentos. Acredito que metade do jogo é ganho no posicionamento da equipe. O treinador deve conhecer seus jogadores, as características de cada um, para poder posicioná-los de forma a otimizar suas performances. Porém, só isso não é suficiente: é preciso conhecer o adversário. É por isso que muitos técnicos mandam olheiros espionarem jogos dos advesários.
Sun Tzu, o autor de A arte da guerra, escreveu: “…aquele que conhece o adversário e a si mesmo, lutará cem batalhas sem perigo de derrota“.
Eu adorava jogar Championship Manager (alguns preferem Football Manager) e inventar maneiras e surpreender o adversário. Fazia o mesmo nos Winning Eleven da vida. Eu era ruim em todos, mas os esquemas táticos me salvaram muitas vezes. Neste post, farei uma análise rápida dos esquemas táticos que deram certo e que falharam na vida real, e o que eu acho deles todos.
Ferrolho
Inventado pelo técnico da Suíça de 1935, Karl Rappan, o Riegel tinha um zagueiro fixo atrás (3) e outros 3 à sua frente (2, 4 e 5) e 1 ou 2 meias ajudando o ataque (6 e 8) sendo que um deles ficava mais recuado e o outro era o responsável pela ligação com o ataque.
O esquema era inovador e surpreendente, e chegou a eliminar a Alemanha. Na Copa de 62 várias seleções utilizaram variações deste esquema (marcação sob pressão, meias e atacantes marcando e zagueiro fixo) que é a base teórica de vários esquemas atuais.
Essa Suíça ia a campo com: 1 Hubber, 3 Minelli, 2 Lehmann, 4 Springer, 5 Vernati, 6 Loertschner, 8 Amado, 7 Abbegglen III, 10 Bickel, 9 Wallaschek, 11 Aeby.
A meu ver, este esquema é o precursor do 4-2-4 e até perigoso de ser usado hoje em dia. Supõe-se que os pontas (7 e 11) voltem para ajudar a marcar e, em caso de contragolpe rápido, os 4 zagueiros têm que se virar na marcação. Zagueiro hoje em dia é peça rara, e atacantes que sabem sufocar então… Além disso, com a ausência de volantes, os zagueiros ficam com essa função. De novo, esperam-se zagueiros habilidosos. Hoje em dia não funcionaria um esquema desse mesmo…
WM
Uma das primeiras organizações táticas do futebol. No fim da década de 1920, o inglês Chapman criou o WM na Inglaterra. Foi trazido para o Brasil por Dori Krueschner. Eram 3 zagueiros (2, 3 e 4), 2 meias defensivos (gosto desse nome) (5 e 6), 2 meias ofensivos(também prefiro esse nome) (7 e 8) e 3 atacantes (9, 10 e 11).
Neste esquema, o zagueiro 3 fica mais fixo, e dois jogadores são recuados para ajudar na marcação (como eu disse no caso do Ferrolho, a marcação ficava exposta).
Acho bonito o desenho tático desse esquema, porém perceba que ficam duas avenidas dos dois lados do campo. Contra um time que joga muito centrado, pode até funcionar, mas contra um time com laterais, alas ou pontas abertos, é um perigo: a defesa pode bater cabeça e fatalmente abrirá grandes buracos deslocando jogadores para as laterais. Em compensação, ainda continua com a ideia da época, de sufocar o adversário já no campo ofensivo, o que alguns técnicos ainda fazem, mas timidamente, hoje em dia.
2-3-5
Esse esquema deu muito certo no Flamengo de 54, quando foi campeão estadual jogando com 1 Garcia, 2 Tomires, 3 Pavão, 4 Jadir, 5 Dequinha, 6 Jordan, 7 Joel, 8 Rubens, 9 Índio, 10 Evaristo, 11 Zagallo.
Pode-se dizer que foi o primeiro esquema tático do futebol moderno. É óbvio que a preocupação defensiva era nula, e a maior preocupação era claramente o ataque. Não eram incomuns goleadas homéricas, tanto devido à habilidade dos ofensivos quanto à falta (e, por que não, inabilidade) dos defensivos.
Neste esquema, o chamado center-half (no caso 5 Dequinha) era o mais habilidoso do time: era ele quem segurava o jogo, tocava de lado, fazia lançamentos em profundidade… Apesar de parecer muito com os futuros camisas 10 da década de 70, esta posição deu origem aos volantes. Dos chamados half direito e esquerdo (4 Jadir e 6 Jordan) nasceram os laterais e alas. O center-forward (9 Índio) deu origem ao centroavante. As funções dos meias era atacar. Os atacantes não voltavam.
Outra formação que dificilmente daria certo hoje em dia. A começar pela fragilidade da defesa. Mas, mais importante do que isso, o ponto chave do sucesso desse esquema tático é a habilidade dos homens de frente. Se por um lado tomavam-se 4 gols numa partida, a frente garantiria 5. Ou mais. Que equipe hoje em dia tem jogadores com capacidade pra, juntos, enfiarem tantos gols na mesma partida? Neste esquema tático, apesar de ser considerado o primeiro do futebol moderno, ainda carregava a cara dos antigos: preocupação só com o ataque. Apesar da cara de novidade, ainda assemelha-se muito ao WM. Daqui a pouco, quando os meias habilidosos surgirem e os pontas começaram a desaparecer, esse desenho vai se inverter.
4-2-4
Quem nunca ouviu falar do 4-2-4? Sempre que ouço esses números, vou direto prá Copa de 70. Não por acaso: foi o Brasil de 1970 que criou esse esquema. O time campeão era esse: 1 Felix, 2 Carlos Alberto, 3 Britto, 5 Piazza, 4 Everaldo, 6 Clodoaldo, 8 Gerson, 11 Rivelino, 7 Jairzinho, 10 Pelé, 9 Tostão.
O esquema que aliou técnica e tática encantou o mundo. Apesar da escalação (nem vou me alongar nos nomes, eles por si só se definem), o esquema ainda era defensivo, apostando mais nos contraataques. Quando defendia, o time todo voltava, só Tostão ficava na frente (lembrando que ele era o reserva natural de Pelé antes de Zagallo assumir a seleção). Quando atacava, Gerson comandava o meio-campo e até chegava ao gol, Jairzinho fechava pelo meio e às vezes caía pelas pontas, e Tostão comandava o ataque com Pelé. Apesar de esse tipo de esquema exigir muito mais dos pontas e exigir que os defensores fiquem parados, as nuances táticas e as jogadas ensaiadas permitiam movimentações surpreendentes durante a partida. O maior exemplo disso é a tal rolada de bola de Pelé para Carlos Alberto enfiar o canudo pro gol.
Não tenho muito o que falar. Os jogadores desse esquema definem-se por si só. A explicação para um time que tinha Tostão, Gerson e Pelé ser tão defensivo é que os outros times também atacavam muito. E um contraataque com a qualidade daquele Brasil de 70 era mortal. Somente com jogadores tão habilidosos permitia-se que um Carlos Alberto (apesar de muito habilidoso também) deixasse a defesa para se aventurar ao ataque. O que nem tinha necessidade, dada a qualidade do sistema ofensivo. Porém a organização dentro de campo permitia que o zagueiro caísse pela direita, se precisasse, e o volante recuasse para ajudar, ou até que o próprio meio-campo matasse uma jogada de ataque do aversário.