Antes de mais nada deixo claro que este jogo não é o da diferença entre futebol brasileiro e europeu. É (mais um) retrato da diferença do Barcelona para o resto do mundo. Muitos consideraram o Santos como um adversário a altura do Barça, chegaram a comparar Neymar a Messi. A imprensa chegou longe demais.
Jogo foi absolutamente dentro do esperado. Barcelona demonstrou todo seu futebol, a escola catalã desde os anos 70. Muricy entrou para simplesmente defender, e especular contra-ataques com o trio ofensivo: Ganso, Neymar e Borges. O resultado foi justo, 4x0, mas poderia ter sido mais.
Como já citei Santos mudou, pensando no Barcelona colocou um 3-5-2, mas com pouca posse de bola lembrou mais um 5-3-2. Aparentemente a idéia de Muricy era ter um homem na sobra ou espelhar o esquema do adversário. Todas variações ou esquemas adotados, caíram por terra.
O Santos não conseguiu jogar, não viu a cor da bola. Este time conquistou a Libertadores e após abdicou do futebol. Não disputou o campeonato brasileiro, apenas entrava em campo. Muricy adotou um esquema neste mundial em que não vinha sendo utilizado.
Barcelona jogou no 3-4-3 (desdobrado em 3-1-3-3). Está variação demonstra a capacidade, leitura tática dos jogadores. Barça sempre jogou no 4-3-3, mas Guardiola achou um esquema ainda mais ofensivo, envolvente e com capacidade de defender sem deixar de ser ofensivo. Não entenderam? O Barcelona quando marca não recua para seu campo, simplesmente os homens de frente marcam os jogadores adversários, não ficam olhando.
Barcelona
Com pequenas sociedades, linhas adiantadas, controle da posse, marcação agressiva e vocação ofensiva, o Barcelona assegura que as suas futuras gerações mantenham intacta esta linda filosofia de futebol.
O Barcelona vem se aperfeiçoando cada ano, com Pep Guardiola o time teve um toque final. Pep reinventa Daniel Alves na ponta direita, continua e mantém a escola de décadas atrás. Define um time sem centroavante, sistema com três zagueiros, mas sem alas. É uma aula, um novo futebol.
Quando com posse de bola, Barcelona era agressivo. Na direita, Dani Alves se tornava um ponta, Messi partia da ponta para o centro e Xavi aproximava-se formando um triangulo. Na esquerda com Iniesta e Thiago Alcântara (este que foi um ponta). Para finalizar Fabregas foi o falso-9 atuando pelo centro e com liberdade.
Mencionei acima a movimentação dos jogadores, mas como é de praxe o Barça não manteve posição. Ora Messi ao centro e Fabregas na ponta. Ora Iniesta no flanco e Alcântara ao lado de Xavi. A marcação complicava? Xavi recuava para receber e distribuir.
Pique atuou como zagueiro central, tendo Puyol e Abidal pelos lados; logo à frente, Busquets completou como primeiro volante o vértice mais adiantado de um losango defensivo.
Dependendo da jogada Busquets pode aprofundar o posicionamento, transformando-se em zagueiro durante momentânea linha defensiva de quatro, abrindo ainda mais Puyol e Abidal pelas laterais; com a posse, Messi naturalmente movimenta-se livre, sem posição fixa, principalmente na região central, voltando para articular a equipe; este recuo proporciona ainda a abertura do setor direito, ocupado por Dani Alves como um ponta, ingressando em diagonal na área para concluir.
O setor da genialidade e vital para dar ritmo ao time é meio campo. Busquets na primeira função, como um volante poste frente a zaga. Xavi e Iniesta como meias centrais. Um triangulo de base alta no meio. Assim como Messi, Daniel Alves não possui posição pré definida, atua na faixa da direita se alinhando a Xavi e Iniesta quando defende, mas faz passagem e se posiciona como ponta quando ataca.
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Confronto tão esperado: Neymar x Messi |
O ataque que pressiona e destoa marcação com Thiago Alcântara no flanco esquerdo, joga procurando o centro para finalização e/ ou passe. Fabregas ao centro e Messi partindo da direita ao centro, sem posição pré definida, “zanzeando” pelo ataque e recuando para indefinir marcação.
É proibido dar chutão no Barcelona. Zagueiros são treinados, para sair jogando de pé em pé. Atrasar a bola para o goleiro não é feio, feio é rifar a bola para frente. Falando em zagueiros, Puyol marcou Neymar, mas não marcou sozinho, geralmente alguém o auxiliava na marcação.
Outro aspecto interessante e determinante é a compactação. Todos jogaram muito próximos, com a qualidade que eles possuem e estando um ao lado do outro é mais fácil para trocar passes, e quando perder a posse de bola a recuperá-la com tempo recorde. Atacando é sempre com no mínimo cinco jogadores, geralmente são seis jogadores e com “apenas” quatro defendendo.
O primeiro gol catalão foi um exemplo de triangulação. Fabregas recebeu passe de Messi e tocou para Xavi, este dominou o passe – era um tijolo - e lançou Messi, Durval errou o corte e o craque argentino com um leve toque abriu o placar.
Mais importante que a descrição tática, entretanto, é a identificação da estratégia usual do Barça – aquilo que podemos chamar de conceito – ou cultura – do clube catalão, transmitido a todas as gerações de jogadores desde a revolução deflagrada por Cruyff. Formam-se no campo aquelas ‘pequenas sociedades’, grupos de três jogadores próximos.
É desta forma que o Barcelona mantém seu alto índice de posse de bola. Não há inversões longas, ligações diretas, decisões apressadas. O controle do jogo se dá com passes curtos dentro de cada pequena sociedade. Se não foi possível progredir com o triângulo formado por Xavi, Dani Alves e Messi – por exemplo, a bola é levada ao triângulo mais próximo, com Iniesta, Thiago Alcântara e Fabregas, e dali pode ir para o centro à frente, recuar, para a esquerda à frente, para a esquerda atrás, voltar à direita…sem pressa.
Lembram contra o Real Madrid? Messi marcou tanto que foi o principal roubador de bolas por parte do Barcelona. A recuperação da bola passa pelo ataque, todos homens cercam, roubam, fazem faltas. Este é o futebol total, o bom futebol da Holanda de 74 passou para um clube.
Santos
Até aqui me retive a comentar este fantástico time que é o Barcelona. Explico-me, ou os números explicam. Posse de bola 76% em favor do time catalão. Como comentar um time que possui apenas 24% de posse de bola? Complicado.
Atuando neste 5-3-2 contrariando as idéias do Barcelona, o Santos defendia em seu campo, por alguns momentos, não mais que isso o time pressionou a saída de bola, mas foram momentos raros. Quando com posse de bola ficavam acuados perante a marcação intensa, saída de bola era rifada.
Única marcação ofensiva e no campo do adversário foi do trio ofensivo: Ganso, Neymar e Ganso. Mas estes eram facilmente envolvidos em uma espécie de “bobinho”.
O Santos abdicou de atacar, primeiramente defendeu, mas só em seu campo. Não saiu para o jogo como é seu estilo, apenas atacava com três ou na melhor das hipóteses quatro homens a frente. Analisando jogo por jogo percebe-se que o Al-Saad deu mais trabalho ao time espanhol.
Em momentos “sóbrios” o Santos conseguiu tocar a bola. Forte pelo flanco esquerdo, mas sem a genialidade de Neymar. Alias considerar alguma jogada do alvinegro como forte é um atestado de loucura, pois o Barça não deixou o Santos jogar.
Muricy optou por não marcar individualmente, já se previa que seria complicado, pois o adversário não possui posição fixa. Marcação foi por zona, quem caísse no setor seria marcado.
Ainda com Danilo em campo o Santos por vezes se configurou no 4-4-2 losango. Danilo e Arouca em certos momentos romperam o meio campo, procurando o ataque. Mas foi com a saída de Danilo – lesionado- e ingresso de Elano que o 5-3-2 deu lugar ao 4-3-1-2.
Segundo Tempo
Inicio de segundo tempo. O time paulista já com uma linha de quatro defensiva. Léo era lateral com maior liberdade, pois Bruno Rodrigo fazia basculação empurrando demais zagueiros. Arouca foi volante frente a zaga, Henrique na esquerda e Elano a direita. Nos movimentos ofensivos, Elano era quem adiantava-se pela direita.
Barcelona continuou o mesmo. Controlou o jogo por completo, ditou o ritmo e não deu chances ao adversário. Diferença do primeiro para o segundo tempo foi o goleiro Rafael, salvou no mínimo três chances claras de gol.
Enquanto havia um pequeno espaço de campo o Barcelona tocava e saía. O jogo no meio campo era de dois toques e sem pressa procurando espaços. A bola girava por todos lados do campo. Na considero um defeito, mas o Barcelona poderia fazer valer o chute de média e longa distancia, pois jogadores de qualidade à.
Algumas mudanças aconteceram, mas sem tempo para influenciar no jogo. Por parte azul e grená: entraram Mascherano, Pedro e Fontas. Saíram Pique, Thiago Alcântara e Puyol. No Santos: entraram Elano, Alan Kardec e Ibson. Saíram Danilo, Borges e Ganso.
Os sistemas se mantiveram, o predomínio catalão também.
Para resumir este Barcelona me faço das palavras de Eduardo Cecconi:
“Desde os anos 70, a partir da ‘escola Cruyff’, o Barcelona desenvolve um conceito de futebol que vai além do grupo profissional. Todas as equipes de base, cada garotinho das ‘canteras’, integra-se ao modelo que não se limita a simples tática. O Barcelona consolidou em quatro décadas um comportamento padronizado, sob qualquer circunstância.”